SONHOS QUE SE ENCONTRAM NAS ALTURAS

Texto: Caio Buni /Fotos: Caio Buni e Aline Badari – originalmente publicado em Revista Sintonia n5/2017.

O sonho de voar acompanha a humanidade desde tempos imemoriais: na mitologia, um exemplo é a ação de Ícaro e Dédalo na lenda da Grécia antiga do voo com asas artificiais para fugir do labirinto. O esforço de tornar possível que a humanidade alcançasse os céus tem uma longa história.

Chineses inventaram a pipa por volta de 300 a.C., inicialmente usada para observações militares e punições de criminosos. Considerado um dos maiores gênios da história, Leonardo Da Vinci no Século XV projetou uma máquina voadora rudimentar e avançou até a asa delta e um protótipo de helicóptero, sempre com ponto de partida na observação da tecnologia e natureza. O brasileiro Santos Dumont realizou o primeiro voo de avião em 1906 com o 14 Bis, seu projeto próprio.

“Uma vez que você tenha experimentado voar, você andará pela terra com seus olhos voltados para o céu, pois lá você esteve e para lá você desejará voltar.” Leonardo da Vinci

Estes são só alguns dos muitos intentos que constituem o caminho que o homem percorreu até aprender a voar. Porém, mesmo hoje esse terreno fértil continua a embarcar em um mar de descobertas com histórias que continuam alimentando muitos sonhos.

O joanopolense de 31 anos Jorge Soto, cresceu desejando chegar aos céus. “Minha paixão pela aviação começou quando nasci”, comenta, que na adolescência dedicava muitas horas do seu tempo aos jogos de simulação de voo no computador, onde amigos jogavam jogos de videogame de corrida, guerra e outros temas. Após concluir o ensino médio, com os pés no chão, fez curso técnico de segurança do trabalho, mas logo se agarrou à oportunidade de entrar na TAM, atual LATAM Airlines.

Na maior companhia aérea da América Latina ingressou como agente de aeroportuária. Sempre estudando, fez faculdade de Ciências Aeronáuticas e ingressou na profissão de comissário de bordo. Paralelamente ao trabalho, continuou a investir em cursos de inglês e tira e brevê – direção de piloto comercial e privado. “A experiência como comissário, inclusive, contribuiu no aprendizado e contato com pilotos da companhia, sempre pegando dicas, aprendendo com cada escala, e pela primeira vez, indo ao voo”. Somando às funções, trabalhava nos pousos e nos voos no mesmo instante.

Da Mantiqueira para os céus, Jorge Soto continua trilhando sua história na aviação e também colabora com novas formas de mostrar como a ciência e as mudanças, com dados teóricos e pilotagem em ações de conscientização aeronáutica.

Um filme da infância e a primeira referência que ficou em sua mente foi obstinado a não perder um acaso, por fim, uma cena de decolagem de pedra junto a um grupo de amigos que visitavam o aeroporto próximo à sua casa. Estava visitando Ninian Stewart Richardson, irlandês que escolheu Joanópolis, quando conheceu Vinícius Guirado, piloto de avião comercial.

“Comecei no aeromodelismo aos 11 anos e a paixão por voar só aumentou. Me formei em estudar engenharia aeronáutica e com 18 anos comecei no Aeroclube de São Paulo e aos 17 anos, não quis mais saber de estudar mais, só voar!” brinca Vinícius.

Ele conta que se formou como piloto em 2001, mas por causa da crise da aviação e inseguranças no setor, por conta do atentado de 11 de setembro, sofreu muita competição com profissionais experientes. “Comecei a voar profissionalmente em 2006 com aviação executiva, em uma empresa chamada Global Taxi Aéreo”, ocupação que durou quatro anos. Desde 2006 é piloto na Gol, onde pilota um Boeing 737 em voos nacionais e internacionais.

Como não consegue afastar-se da aviação nem nas folgas, quando não está trabalhando, pratica aeromodelismo. Diversas vezes no sítio do Ninian. Desta vez, trouxe consigo dois companheiros de aeromodelismo, Mateus e Felipe, que possui um aeromodelo, réplica em pequena escala de Tiger Moth amarelo, mesma cor e modelo do raro avião do anfitrião.

Ninian conta que quando era criança, na Inglaterra, morava próximo a um aeroporto, onde ficava assistindo decolagens e pousos de Tiger Moths, pensando “um dia terei um destes”. Anos se passaram e em uma viagem para Belfast, na Irlanda do Norte, comprou uma revista de aviação, onde havia um anúncio de venda de um avião Tiger Moth na sua cidade de destino.

Aproveitando a coincidência, o sonho tornou-se realidade. Comprou o avião e o mandou para o Brasil em um container. A aventura da compra e a novela da regularização do avião no Brasil, hoje é contada como uma história longa e curiosa. Em resumo, Ninian empenhou muita energia para hoje poder voar com seu Tiger Moth sobre nossa região.

A trajetória do avião de Ninian, também merece destaque: “durante a Segunda Guerra o avião ficou na Casa Branca, depois foi para a França e em seguida para a Irlanda, tendo sido propriedade do IRA (Exército Republicano Irlandês, grupo separatista da Irlanda do Norte)”, conta Ninian. Por fim, acabou recebendo o primeiro registro de avião histórico da Agência Nacional de Aviação Civil – ANAC. E hoje é um dos poucos Tiger Moths em pleno funcionamento com peças originais.

Enquanto Ninian apresentava seu avião e os aeromodelistas praticavam manobras ousadas demonstrando experiência, avistamos uma pequena aeronave voando sobre nós, que logo foi amistosamente convidada para pousar através de gesticulações.

Em seguida, um, dois, três, quatro, cinco! Trikes aterrissaram na pista de Ninian. Eram Luiz Favero e sua filha Tatiane, da Trike Icaros (trike.com.br), que estavam fazendo um voo com amigos em colaboração com o programa Aero – Por Trás da Aviação (bit.ly/aero-aviacao).

“Minha primeira experiência de voo foi com o guarda-chuvas da minha avó, que não deu resultado, pulando de cima do telhado” brinca Luiz, que há mais de trinta anos vem desenvolvendo equipamentos de voo, movido à paixão. Passo a passo, através de muitas experiências desenvolveu os Trikes, que podem ser descritos como motos voadoras, até que o projeto tornou-se uma empresa. Tatiane que cresceu acompanhando a dedicação de seu pai à aviação, hoje compartilha do seu sonho e está ao seu lado na Trike Icaros.

Com hangar em Atibaia, a empresa promove voos na região e acumula registros de aventuras ousadas de trikerros, Brasil afora.

Nesse inusitado encontro ocorrido às margens da Represa Jaguari, ouvindo histórias de vida de aviadores profissionais e amadores, pude perceber que o sonho de voar é mais comum do que se imagina e que as possibilidades de alcançá-lo são mais diversificadas e viáveis do que pode parecer. Seguindo os exemplos de nossos amigos, dê asas aos seus sonhos!