A entrevista com Cidão oferece um panorama detalhado da trajetória da Festa do Divino em Joanópolis, com memórias de infância, o resgate da Festa e suas composições musicais.

Benedito Aparecido Pinheiro, o Cidão, é um contador de histórias e guardião da memória da Festa do Divino Espírito Santo de Joanópolis. Poeta e compositor, Cidão representa a ligação viva entre o passado e o presente da celebração. Além de ser testemunha da tradição original (o “divino escondido”) vivenciada na infância, ele se tornou um colaborador ativo no resgate da festa, compondo canções essenciais para o repertório do Divino e da Folia de Reis, garantindo que as histórias, a fé e a música local continuem a ser transmitidas às novas gerações.

Resumo da entrevista

Antigamente, a Festa do Divino funcionava de forma itinerante. Uma pessoa, chamada “bandeiro do Divino”, saía com a bandeira, chegava nas casas e ali se fazia uma festa que durava a noite toda, com muita reza, orações e cantoria. Pela manhã, antes de ir embora, eles pediam prenda para a festa. Cidão lembra que isso acontecia na casa de sua mãe, quando ele ainda era criança, e as pessoas levavam o que podiam: ovo, galinha, porco. Essas prendas eram frequentemente resultado de promessas feitas ao Divino por graças alcançadas, como a cura de um cavalo doente. A fé das pessoas era muito forte, mas com o tempo e o falecimento dos mais velhos, que não tinham quem ensinasse os jovens a seguir a tradição, o Divino “morreu” e ficou escondido por cerca de 50 anos.

O resgate da festa só foi possível graças à Professora Neide, que descobriu o folclore local e a tradição do Divino. No começo, o grupo era pequeno, saíam de carroça e cantavam poucas músicas. Cidão começou a participar, mesmo sem ser um violeiro profissional. A pedido da Professora Neide, ele começou a tentar compor músicas para a festa, apesar de não saber muito de viola. Ele criou canções como “Divino no Sertão” e, mais tarde, “O Manto de Luz”. Neide adorou a música e, a partir de então, também se inspirou para compor, aumentando o repertório da festa. O movimento cresceu muito, chegando a reunir até 500 pessoas.

Cidão relata o quanto se emociona por ter feito parte desse renascimento e por ter contribuído, inclusive, para a nova geração. Ele menciona que a Professora Neide, antes de falecer em 2019 (logo antes da pandemia), preparou Laís — que é sua sobrinha e a quem ele já havia introduzido nos grupos de Matutos — para dar continuidade à tradição. É um caminho traçado pelo Espírito Santo, e a expectativa é que Laís continue iluminada para manter e ensinar a tradição aos que estão chegando.

Além do Divino, Cidão relembra outras tradições perdidas, como a visita das pessoas com os balainhos de São Gonçalo e São Benedito, que também pediam prendas. Ele conta que sua mãe fazia festa de São Gonçalo todo ano, com altar e a famosa “Capelinha de Melão”. Na época de solteiro, ele e outros jovens davam voltas em São Gonçalo para arrumar namorada e casar. Ele também compartilha a inspiração por trás de suas criações, como o poema “Outro Milagre” sobre Nossa Senhora Aparecida, e conta a história da música “Barquinho”, que surgiu ao ver um barco sob um arco-íris na praia.

Com a chegada da COVID-19, a festa ficou parada, mas o grupo resolveu fazer lives para manter a presença do Divino, embora isso não se comparasse à celebração presencial. Cidão afirma que a Professora Neide deixou um legado imenso, mas quem continua agora precisa ter muita devoção, pois o Divino Espírito Santo é o espírito de Deus e tem um significado profundo que muitos não compreendem totalmente. Ele finaliza expressando sua esperança de que o filme ajude a preservar a memória e espalhe a história, pois a história do Divino em Joanópolis no tempo antigo foi muito forte e precisa ser conhecida.

Ficha Técnica

Produção Executiva: Lili Andrade
Direção: Caio Buni
Assistência de direção: Aline Badari
Direção de fotografia: Gilberto Rodrigues